A cidade estava linda, toda preparada para receber os convidados para a grande festa literária que, uma vez por ano, inspira autores, editores, agitadores culturais e muita gente interessada em literatura. O Centro Histórico de Paraty, com seus casarões coloniais e suas estreitas ruelas cobertas de pedras, era uma linda mistura de amores, cores e aromas.
Era tarde de quinta-feira, primeiro dia de Flip, quando um cheiro delicioso e persistente, lembrando caramelo e chocolate, tomou conta do cruzamento de duas das principais vias históricas da cidade, ali na Rua da Matriz com a Rua da Lapa. Tratava-se do Juan, um simpático equatoriano que é o barista e o mestre de torra de uma pequena e aprazível cafeteria chamada Montañita.
Em pouco tempo, praticamente todos os pedestres do Centro Histórico foram hipnotizados pela fragrância dos grãos frescos sendo torrados, ganhando vida e corpo. Era como naquelas cenas de desenho animado nas quais o personagem, mesmerizado pela memória olfativa, flutua em meio à névoa aromática de uma torta recém-saída do forno. Uma fila de proporções consideráveis, formada por leitores ativados pelo cheiro da torra, tomou as ruas.
Café + livro = paz mundial
Verdade seja dita: um dos melhores companheiros para uma boa leitura é uma deliciosa xícara de café – uma simbiose certeira, calcada na sabedoria popular, que criou o feijão com arroz e a goiabada com queijo. Portanto, a Montañita estava no lugar certo, na hora certa.
Ainda bem que o Juan tem a ajuda da Nerita, sua esposa gente finíssima, brasileira, que pilota a máquina italiana de espresso com segurança. Enquanto ele cuidava da torra, ela preparava as bebidas e servia os clientes. Como em um sítio no qual a produção é familiar, assim também é a cafeteria.
Juan pilota sua torradora à moda antiga. Ao invés de laptops com gráficos de controle, todas as suas anotações são feitas com caneta em uma folha de papel pautado apoiada numa pequena prancheta. Naquela tarde, o grão vinha diretamente do Equador, sua terra natal. A variedade era bourbon sidra, cultivada a 1300 metros de altitude na fazenda Finca Perla Negra, lá nas montanhas equatorianas.
O bacana de provar cafés de outros lugares do mundo é poder entrar em contato com sabores diferentes. Pedi um coado no Hario V60. A torra do Juan ressaltou uma finalização impressionante e persistente de cereja! Obviamente, os pacotes sumiram rapidamente da prateleira.
A Flip é de fato um evento inspirador. Agrega pessoas com diferentes saberes, mas com a mesma vontade de trocar experiências, exatamente como o café.
Se um dia quiser morar em Paraty, ok! Tem o Montañita.
Eduardo Frota é jornalista, barista e apaixonado por café